Dia Internacional da Privacidade de Dados | Data Privacy Day

Privacidade dos Dados: video killed the radio star… e todas as outras “estrelas"

por/by Paula Cordeiro (*)

O Dia Internacional da Privacidade de Dados é uma boa oportunidade para falamos de atenção - da nossa atenção - e não da tecnologia. Se por um lado sabemos que a tecnologia invadiu todos os aspectos da nossa vida, e que há muitas falhas de segurança que põem a nossa privacidade em perigo, por outro, abdicámos da nossa privacidade para usarmos serviços gratuitos que nos facilitam a vida. Será que facilitam? Estamos mal informados e até, desinformados em relação à forma como os nossos dados são utilizados, quem os utiliza, com que objectivos e com quem são partilhados. Além disso, também acreditamos, de forma muito inocente, que os nossos dados, uma vez na nuvem, se perdem, como se fossem atirados para o imenso vazio, no espaço sideral. Os dados ficam na nuvem, o que quer dizer que estão algures entre cabos de fibra óptica que ligam computadores em todo o mundo. Queremos saber, mas na verdade, ninguém quer saber. As vantagens de estar online, e ter acesso ao mundo na palma da mão, são mais atraentes do que a obsessão com a segurança e a privacidade, para protegermos a nossa identidade e o que partilhamos. A ignorância por vezes é uma benção, excepto em relação ao facto de ignorarmos que, neste processo, estamos a perder algo muito valioso: a nossa atenção.

Para onde foi a nossa atenção?

Nos anos oitenta os Buggles cantavam “Video Killed The Radio Star”, decretou-se a morte da rádio em prol do vídeo face à revolução que a MTV veio introduzir. Hoje, os adolescentes ignoram a MTV (na verdade, alguém ainda vê MTV?) e ficam no Tik Tok a cantar refrões de 15 segundos de canções que nunca ouviram do início ao fim. Este é um pequeno exemplo de como a nossa atenção é cada vez menor, perdida entre os vários ecrãs que usamos todos os dias e durante todo o dia, num processo que investigadores definem como “a atenção roubada pelos media sociais”. Já há evidências que provam que estamos perante um problema social com implicações sérias para a forma como vivemos, conduzindo a um processo de degradação cognitiva que nos afecta a todos. Um estudo recente sobre a utilização de smartphones por crianças e jovens adultos mostra a ligação a problemas de saúde mental e stress. O stress é um dos aspectos que mais contribui para diminuir a nossa capacidade para dedicar atenção e, entre outros aspectos, resulta do FOMO*, quer social, quer profissional. A ideia de que podemos estar a ser excluídos de alguma actividade social, bem como a ideia de que temos de estar sempre contactáveis provoca-nos elevados níveis de ansiedade. Ao mesmo tempo, ignoramos - ou esquecemos - como usar a tecnologia a nosso favor, para nos ajudar a desconectar e a relaxar. Além disso, os media sociais, sobretudo as redes e aplicações sociais, são desenhadas para nos viciar, usando uma lógica de jogo e captando a nossa atenção para nos manter a olhar o feed de forma infinita. As gerações mais novas são mais propensas a desenvolver psicopatologias que este comportamento pode causar e os resultados do PISA mostram que a digitalização não nos ajuda a aprender mais e melhor. Temos um problema entre mãos. Don Tapscott, consultor de tecnologia, afirma que temos a geração mais inteligente de sempre, enquanto Michel Desmurget, neurocientista, compila informação científica no livro “A Fábrica de Cretinos Digitais” afirmando que os ecrãs estão a transformar os nossos filhos em idiotas. Em quem deveremos acreditar?

As redes sociais fazem scroll à nossa empatia

Helen Riess, MD, explica que os ecrãs, as novas formas e ferramentas para comunicação interpessoal, como as redes sociais, sms ou correio electrónico, também contribuem para destruir as nossas funções neuronais que nos permitem sentir empatia. Um questionário aplicado a jovens adolescentes do sexo feminino, sobre a utilização da internet e aplicações móveis para apoio psicológico, mostra que 97,4% destas jovens usa principalmente aplicações para comunicação e entretenimento. Estamos a falar de 755 crianças e adolescentes entre os 11 e os 16 anos que frequentam uma escola pública na zona sul de Inglaterra. Podemos ver o impacto na atenção dos estudantes universitários, inferior a um minuto, ao mesmo tempo que os adolescentes usam, simultaneamente, seis formas de media diferentes. Investigações recentes sugerem que a actividade multitarefa é uma ilusão. Saltitar entre actividades diferentes ao mesmo tempo torna-nos menos produtivos e destrói o nosso cérebro. Neste mundo hiperligado, somos levados a usar os ecrãs durante a maior parte do dia e para a maior parte das tarefas, alienando-nos do mundo em que vivemos. A investigação na área também mostra que estamos a reconfigurar os nossos cérebros para que este execute tarefas em espaços de tempo cade vez mais curtos. Por consequência, estamos a perder a nossa capacidade para usar os recursos do nossos cérebro no seu todo, e somos menos produtivos. Johann Hari, escritor, usa vários exemplos para provar o impacto social e pessoal da destruição da nossa atenção. O autor recorda-nos que a culpa não é nossa, mas antes dos empregadores e empresas de tecnologia, o que me leva a pensar que será da nossa responsabilidade encontrarmos formas de vivermos com a tecnologia e de a usarmos a nosso favor. Se usarmos a tecnologia como uma ferramenta que nos permite viver melhor, poderemos reclamar a nossa individualidade, privacidade e atenção, contrariando os que nos tentam, a todo o custo, convencer do contrário: as big 5, ou seja, as grandes empresas de tecnologia, Microsoft, Amazon, Google, Facebook e Apple. Já agora, quantos ecrãs tem ligados em simultâneo?

(*) Texto escrito segundo o anterior acordo ortográfico

Data Privacy Day: video killed the radio and any other star

por/by Paula Cordeiro

On Data Privacy Day, I take the opportunity to talk about attention rather than technology. We are all aware that technology has invaded every corner of our lives. We also know that significant privacy leaks have already happened, and our privacy is in danger. Yet, we give up our privacy and share our data for free online services.

Where is our data going?

Millions of us are unaware and uninformed about how our personal information is being used, collected or shared in our digital society. Most of us still innocently believe that somehow and somewhere, our data will vanish, as if we'd put it out there in the dark, infinite and unreachable outer space. It's actually in the cloud, somewhere in between optical fibre connections and computer terminals worldwide.

Do we care?

We care, but no one cares. The advantages of being constantly online and having the world in our hands seem much more appealing than obsessing about the safety and privacy of who we are and what we share. This bliss of being unaware of a problem brings to mind an ever bigger growing issue related to what we share and how we do it, spending countless hours staring at our screens: attention.

Where did our attention go?

In the eighties, the Buggles sang “Video Killed The Radio Star”, announcing the predominance of video amid the MTV revolution. Today, teens ignore MTV (in fact, does anyone still watch MTV?) while logging into TikTok and singing a 15-second chorus of songs they have never heard from beginning to end. Songs are the tiniest example of how our attention span has diminished in recent years while alternating screens during all of our waking hours, a process that some researchers refer to as “the attention was stolen by social media”. There's enough evidence to show that we face a social problem with enormous implications for how we live, leading to a cognitive degradation process that affects us all.

FOMO is REAL

A recent analysis of 924 articles regarding the prevalence of problematic smartphone usage among children and young adults has shown ties to mental health issues and stress. Stress is considered to be one of the main factors that ruin our attention span, and stress comes either from social FOMO* as well as professional FOMO*. We feel stressed about being left socially and stressed professional because we believe we need to be always available, forgetting how to use technology to help us disconnect and relax.
Furthermore, social media is designed to hook us, captivating our attention to keep us scrolling. Younger generations are more vulnerable to developing psychopathologies this behaviour can cause, and PISA* results show that digitalisation does not help us to learn. We have a real problem on our hands. Don Tapscott, the tech consultant, says that we have the most intelligent generation ever, while Michel Desmurget, a neuroscientist, compiles scientific research to prove that screens turn children into idiots. Who should we believe?

Social media takes our empathy away.

Helen Riess, MD, explains that screens and new forms of interpersonal communication, like social media, texts or email, also degrade the neurological keys to feeling empathy. A recent survey of young adolescent girls using the internet and smartphone apps for mental health support shows that 97.4% of the surveyed adolescents use applications daily for communication and entertainment. We are talking about 775 girls aged 11–16 attending a state-funded secondary school in the southwest of England. We can see the impact around us. University students’ attention span is shorter than one minute, and teenagers follow around six media forms simultaneously. New studies suggest that successful multitasking is an enormous delusion, as juggling between several things at once is less productive and damages our brains. In this hyperlinked world, we are asked to use screens for the majority of day-to-day tasks, alienating us from the world we live in. Research shows that we are reconfiguring our brains to operate in shorter time frames. The cost is losing our ability to be conscious, use full brainpower, and be productive. Johann Hari, the writer, uses several examples to prove the personal and social impact of attention degradation. He reminds us that we are not to blame but rather employers and tech companies, which leads me to consider it's our responsibility to find better ways to live with technology as a tool, reclaiming it from those trying to convince us to do the opposite, namely the big 5: Microsoft, Amazon, Google, Facebook and Apple. Were you using a screen to read this?

*FOMO: Fear of Missing Out (medo de ficar de fora)

*PISA: The OECD programme for International student assessment (programa da OCDE para avaliação dos alunos)


Further reading:

Stolen Focus: Why You Can’t Pay Attention by Johann Hari

The Empathy Effect, by Helen Riess

The Digital Cretin Factory, Michel Desmurget

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